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Enviada em 07/10/2014

É necessário, de fato, o jejum para coleta de exames laboratoriais?

Uma questão polêmica que tem sido bastante debatida ultimamente!

É necessário, de fato, o jejum para coleta de exames laboratoriais?
Esta questão polêmica tem sido bastante debatida ultimamente, em especial nos congressos de entidades representativas dos profissionais ligados diretamente ao diagnóstico laboratorial.
E não é para menos. De acordo com dados apresentados pelo IBGE, contidos na Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária (AMS) de 2009, o Brasil possui em torno de 17.000 laboratórios de análises clínicas espalhados pelo país – incluindo os laboratórios que estão em hospitais, clínicas e outros estabelecimentos de saúde com ou sem internação.
Desta forma, a questão da interferência ou não do jejum no resultado de um exame laboratorial afeta diretamente os profissionais que trabalham nesse universo, assim como o próprio paciente.
Para manter o debate ativo, o Portal LabNetwork perguntou a representantes de classe e representantes de laboratórios de pequeno, médio e grande portes qual era a sua posição em relação ao tema. Confira a seguir o resultado.
 
Irineu Grinberg, presidente da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC)
Estudos realizados nas mais diversas partes do mundo apontam, sistematicamente, que a maior incidência de erros laboratoriais se encontra na fase pré-analítica, isto é, desde a solicitação médica até a entrada da amostra para o seu processamento técnico no laboratório.
Vários grupos de pesquisadores estudam este assunto buscando as fontes destes erros e propondo cuidados especiais para minimizá-los ao máximo, com o objetivo de reduzir o impacto nos resultados. Dentre estes fatores formadores de erros os principais são os exercícios físicos, os medicamentos e a alimentação.
Apesar dos notáveis avanços na tecnologia e automação dos laboratórios, os resultados dos testes ainda sofrem a influência destes fatores pré-analíticos e que podem causar variação nos resultados.
Estas variações tornam-se significativamente relevantes quando os valores estão situados próximas ou em zonas de decisão clínica.
Sabe-se perfeitamente que alguns parâmetros/analitos não são influenciados pela alimentação. Entretanto, no conjunto das solicitações de exames laboratoriais estes testes quase sempre vêm mesclados com outros exames em que o jejum é recomendado. Seria um contrassenso sugerir dupla coleta nestes casos.
Em situações de emergência, ou urgências hospitalares, estes critérios (ausência de jejum) poderão ser adequados às necessidades, convindo sempre que deverão estar registrados no laudo laboratorial.
A comunidade científica internacional permanece recomendando o jejum para a maioria dos exames como medida de segurança até que seja possível, através de trabalhos científicos, garantir a não influência deste fator nos resultados.
 
 Luisane Vieira, Médica Patologista Clínica, Vice-Diretora Científica da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML)
A Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial, da qual sou a atual Vice-Diretora Científica, já trata desta questão há dois Congressos e estamos liderando no momento um grupo de trabalho para a elaboração de um novo consenso sobre a solicitação de jejum antes de exames laboratoriais.
Primeiramente, precisamos definir “jejum”. Segundo a maior parte dos autores, é um período superior a 8 horas, no qual há ingestão apenas de água pura. Após as 14 horas sem alimentação, temos o jejum prolongado.
A alimentação pode interferir sobre os exames laboratoriais de duas formas principais.
A primeira, que não pode ser “abolida”, é sobre o nível de analitos que variam de acordo com a ingestão de alimentos. Estão nesta categoria, por exemplo, a glicose, a insulina, os triglicerídeos. Nestes casos, a informação sobre a duração do jejum antes da coleta é importante para a interpretação dos exames, em função dos intervalos de referência.
A segunda interferência pode ocorrer em função do exame e do método usado pelo laboratório. Caso a ingestão de gorduras seja importante, ou caso a pessoa metabolize a gordura ingerida mais lentamente, o seu sangue pode se mostrar lipêmico no momento da coleta sem jejum (e, raramente, mesmo após o jejum). A lipemia torna a amostra mais turva e alguns métodos de laboratório são sensíveis a esta turvação e podem gerar resultados errôneos (para mais ou para menos).
A principal questão que atualmente está sendo discutida é a necessidade de jejum para evitar a interferência da lipemia em algumas metodologias. As tecnologias de realização de exames têm evoluído, hoje usamos volumes menores de amostras, alguns equipamentos detectam e tratam a lipemia, e alguns métodos, como a química seca, são pouco sensíveis a ela. Desta forma, a liberação do jejum ainda é específica do laboratório para grande parte dos exames, uma vez que nem todos utilizam os mesmos sistemas.
Outra situação que nos preocupa muito é a ausência de uma verificação laboratorial viável para confirmar se o paciente está ou não realmente em jejum. Algumas vezes, ao ser perguntado sobre jejum, o paciente informa positivamente, mas omite alguma ingestão, de forma deliberada, por mero esquecimento, ou por acreditar que aquilo que ingeriu não “quebra” o jejum. Desta forma, às vezes acreditamos que a amostra foi obtida em jejum, mas não foi. A simplificação desta instrução pode vir a beneficiar os pacientes.
No último Congresso da SBPC/ML, no Rio de Janeiro, participei de uma mesa-redonda sobre a questão com plateia lotada, o que mostra o grande interesse dos laboratórios na questão. Ela vai continuar a ser discutida no âmbito da Sociedade, com a participação de profissionais de diversos laboratórios, até termos um consenso mais atual sobre a questão, o qual leve em consideração os progressos das atuais tecnologias.
 
 Rafael Jácomo, Diretor Técnico do Laboratório Sabin
O jejum é estritamente necessário em exames relacionados diretamente ao processo de digestão, como glicemia e triglicerídeos. Nestes casos, a coleta fora do período adequado pode levar a resultados que não são, de fato, clinicamente significativos.
Para os demais, um período entre duas e quatro horas é o adequado, visando diminuir interferentes. Entretanto, em casos de urgência/emergência ou conforme orientação médica, os exames podem ser realizados mesmo com jejum inadequado.
 
Nairo Sumita, Assessor Médico na área de bioquímica clínica do Fleury Medicina e Saúde
O exame laboratorial é um importante instrumento de auxílio no raciocínio clínico e na conduta terapêutica, constituindo-se num indicador sensível e objetivo do estado da saúde do paciente. Desta forma, o resultado de um exame laboratorial constitui-se numa informação complementar que auxilia na definição do diagnóstico. Grande parte das condutas clínicas é tomada a partir de alterações nos dados laboratoriais.
O elevado grau de confiabilidade dos exames de laboratório pode ser creditado, em parte, ao processo de evolução dos métodos laboratoriais e também à incorporação de novas tecnologias, os quais possibilitaram a obtenção de resultados com elevado grau de exatidão, reprodutibilidade e rapidez. Novos parâmetros são desenvolvidos e incorporados à rotina laboratorial, permitindo um melhor entendimento da fisiopatologia das doenças e otimizando o diagnóstico clínico e a terapêutica.
Segundo a literatura científica, a fase pré-analítica do exame laboratorial é responsável por cerca de 70% do total de erros ocorridos nos laboratórios clínicos. A fase pré-analítica inclui a indicação do exame, redação da solicitação, leitura e interpretação da solicitação, transmissão de eventuais instruções de preparo do paciente, avaliação do atendimento às instruções previamente transmitidas, procedimentos de coleta, acondicionamento, transporte e preservação da amostra biológica até o momento da efetiva realização do exame.
Dessa forma, a fase pré-analítica se desenvolve pela sequência de ações de um grande número de pessoas, com diferentes formações profissionais, desde o médico solicitante até o paciente.
De uma forma ideal, o médico solicitante, ou seus auxiliares diretos, devem ser os primeiros a instruir o paciente sobre as condições requeridas para a realização do exame, informando-o sobre a eventual necessidade de preparo, como jejum, interrupção do uso de alguma medicação, dieta específica ou mudanças na prática de alguma atividade física.
Assim, para a coleta de sangue para a realização de exames laboratoriais, é importante que se conheça, controle e, se possível, evite algumas variáveis que possam interferir com a exatidão dos resultados, sendo que o jejum pode ser um dos pontos críticos a ser considerado.
Um bom preparo antecedendo um teste diagnóstico, muitas vezes tem um peso tão grande quanto o da própria análise do sangue. A orientação de fazer a coleta após um intervalo variável de tempo, sem ingerir alimentos vem, em primeiro lugar, de uma exigência técnica de padronização. Isso porque muitos dos valores de referência que vemos nos resultados dos exames foram determinados em pessoas, de quem o sangue foi colhido em jejum. Portanto, para que os resultados possam ser comparados aos valores de referência, é preciso realizar os testes laboratoriais exatamente nas mesmas condições. Além disso, convém ressaltar que após a alimentação pode ocorrer, momentaneamente, uma alteração na composição dos elementos do sangue. Sem o jejum, os resultados dos exames teriam alguma utilidade se interpretados considerando o que a pessoa comeu e bebeu antes da coleta. Se pensarmos bem, algo inviável tanto para o médico que pediu o teste, quanto para o laboratório, pois a quantidade e a qualidade dos alimentos ingeridos são muito diferentes de pessoa para pessoa.
Na prática, a grande maioria dos exames de sangue exige, no mínimo, um jejum de três a quatro horas, combinado a um breve período prévio de repouso, já que o estresse e a atividade física também podem interferir nos resultados de alguns exames. É por isso que, na maior parte dos casos, são pedidas de oito a doze horas de jejum, com a coleta realizada, preferencialmente, no período da manhã. A exceção fica por conta do perfil lipídico, particularmente a dosagem do triglicérides, que precisa ser feita após jejum de, no mínimo, 12 horas, porque a ingestão de alimentos pode elevar os níveis de gordura e determinar um valor falsamente aumentado do triglicérides. A dosagem de glicose para o diagnóstico de diabetes também exige, conforme consenso, um jejum de 8 horas.
A variação cronobiológica corresponde às alterações cíclicas na concentração de um determinado parâmetro em função do tempo. O ciclo de variação pode ser diário, mensal, sazonal, anual etc. Variação circadiana, ou seja, diária, acontece, por exemplo, nas concentrações do ferro, do cortisol, dos hormônios tiroidianos, da testosterona entre outros. Assim, alguns exames exigem a necessidade de coleta no período da manhã para que a variação fisiológica observada no transcorrer do dia não cause confusão na interpretação do resultado laboratorial.
A busca contínua pela excelência e a qualidade técnica sempre foi o foco na atividade do Fleury. A competência e a confiança conquistadas ao longo da história do Fleury devem-se, em parte, ao corpo de médicos especialistas na área diagnóstica com formação nas melhores escolas médicas nacionais e internacionais, muitos deles com atuação ativa nas melhores universidades do país. Assim, o Fleury segue rigorosamente as boas práticas, sempre baseadas nas evidências científicas e nos consensos universalmente aceitos pela comunidade científica, embasados nos conhecimentos mais recentes e na ética.
 
Junia Dias Franco Pérez, Gerente de Suporte Clínico e Pós-Analítico do Grupo Hermes Pardini is são as implicações práticas da abolição do jejum antes da coleta dos exames laboratoriais? Atualmente, as coletas de sangue nos laboratórios se concentram no período inicial da manhã. Do ponto de vista prático, a não exigência do jejum traria uma maior comodidade para o paciente, pois o mesmo poderia escolher ir ao laboratório no horário mais adequado de acordo com a sua rotina. No entanto, o valor de referência da maioria dos exames foi definido em indivíduos saudáveis que estavam em jejum antes da coleta de sangue e não existem trabalhos científicos publicados que garantam que a ausência de jejum não interfira com os resultados de todos os exames. Os poucos trabalhos que estudaram a influência do jejum sobre os resultados de diferentes substâncias sanguíneas sugerem que a coleta de sangue após a alimentação tem o potencial de interferir no resultado de alguns exames e prejudicar a interpretação dos mesmos.
Em que situações a coleta de exames de sangue pode ser realizada sem a necessidade de jejum? A ausência de jejum não interfere na dosagem de alguns exames, como colesterol total, colesterol HDL, hemoglobina glicada. Não obstante, para a dosagem do colesterol LDL calculado e dos triglicérides, é obrigatório um período de 12 horas de jejum. Dependendo do laboratório, os exames para o diagnóstico de doenças infecciosas e autoimunes podem ser feitos sem necessidade de jejum. Evidentemente, em situações de urgência e emergência, os exames devem ser colhidos imediatamente, mesmo que o paciente não esteja em jejum.
 
Rosa Prestes da Costa, Farmacêutica-Bioquímica, Diretora do Laboratório Unidos
Há alguns anos esse assunto está sendo discutido e cada laboratório acaba achando seu caminho e estabelecendo sua rotina de coleta mais diluída ao longo do dia em função da sua visão.
Sabemos que os métodos mudaram e alguns reagentes hoje utilizados não sofrem a influência da alimentação e o jejum acaba sendo dispensado para  exames como hemograma, ureia, creatinina, sódio, potássio e alguns hormônios. Para dosagem de glicose ainda utilizamos 8 horas de jejum e 10 a 12 horas para triglicerídeos e colesterol HDL. Para a maioria dos exames, o laboratório Unidos recomenda 4 horas de jejum, o que permite atender o cliente ao longo do dia, ou de acordo com a exigência médica, sempre informando no laudo o período de jejum do cliente.
 
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